jeudi 20 décembre 2012

Fim do Mundo "à nossa maneira"!

Senhoras e senhores, permitam-me proceder à leitura de um comunicado.




COMUNICADO



É com grande seriedade e profissionalismo que Angola, como o resto do planeta, encara a triste e fatal realidade do Fim do Mundo, tal como previsto no calendário Maya. Um evento desta importância não deixa de ser uma ocasião única para o nosso País dar mais uma vez provas da sua maturidade política e social. É pois, com o esforço conjugado de todos os angolanos e do Executivo sob firme e clarividente condução de sua Excelência Camarada Presidente José Eduardo dos Santos, que levaremos a nossa jovem Nação a mais este patamar importante na cena Internacional.


Não obstante a vontade e o esforço ingente de toda a equipa governativa, alguns obstáculos persistem em elevar-se no nosso caminho. Problemas de ordem técnica, logística e humana impedem-nos de cumprir com a meta imposta do dia 21 de Dezembro de 2012.



Um pouco por toda a parte no nosso glorioso País, constata-se a recrudescência de actos de sabotagem a vários níveis, impossibilitando-nos de ter as condições reunidas para receber o evento acima mencionado. Chegou ao nosso conhecimento que um ataque concertado a várias estações e postos de distribuição de electricidade provocou problemas graves na rede de distribuição da mesma, pelo que as províncias de Cabinda, Zaire, Uíge, Bengo, Luanda, Malanje, Lunda Norte, Lunda Sul, Kwanza Norte, Kwanza Sul, Benguela, Huambo, Bié, Moxico, Namibe, Huíla e Kuando Kubango não se encontram capacitadas para condignamente e sem riscos para a população, acolher nas melhores condições o Fim do Mundo. O Cunene é a única província com fornecimento eléctrico (vindo da Namíbia) suficiente para o efeito. Um investimento à altura de 127 mil milhões de dólares, em parceria com a China-Bling-Bling e a Israelight Corporation, permitirão a resolução do problema nas províncias de Luanda, Cabinda, Malanje, Huíla, Lunda Norte e Benguela em 2031 numa primeira fase, sendo necessário para a segunda e derradeira o dispêndio de 300 mil milhões de dólares adicionais até 2047.



Quanto ao fornecimento de água potável, é de realçar que a violência extrema das recentes tempestades que se abateram sobre o território Nacional provocou perdas materiais consequentes nas redes de distribuição. A EPAL, após estimativa dos danos, aponta o horizonte 2017 como data expectável para vermos o problema solucionado nos principais centros urbanos do País. Para a província do Namibe, cuja bacia hidrográfica escassa e composição desértica do solo se elevam como desafios suplementares, está previsto um investimento de 4 mil milhões de dólares em aparelhos de dessalinização de água do mar, a fim de optimizarmos este recurso natural numa província com vasta linha litoral. Prevê-se que a operação de transformação, assim como a capacitação de técnicos nacionais para operarem com o material de ponta, permitam já no ano de 2018 fornecer 37% da província com água potável extraída do mar, o que fará de Angola uma referência na matéria na África Austral.



Todas estas medidas, temos consciência, necessitarão de um tempo mais longo do que aquele que nos quer deixar o calendário apocalíptico, pelo que vimos por este meio informar que o fim do mundo em Angola terá de ser adiado sine die, visto não termos estrutura nem estarmos preparados para receber este evento... O executivo quer criar as condições necessárias para que não falte pelo menos água e luz a todos os cidadãos angolanos, para que possam iluminar os seus derradeiros momentos na maior tranquilidade possível. Queremos também incitar cada angolana e angolano a dar o seu contributo nesta acção de vulto, que não se fará sem cada um de nós. Vamos todos unir esforços, dar as mãos num acto de solidariedade, para que o Fim do Mundo em Angola seja um evento que marque as memórias e sirva de referência para as gerações vindouras no respeitante à nossa capacidade de organização e gestão de crise.





Angola faz, Angola faz. Mas sempre e cada vez mais, COM A SUA GENTE!



lundi 17 décembre 2012

Kamba diami - os da minha aldeia mundial

Minha Angola que me pariste, Santa Mãe da minha Mãe e da Mãe da minha Mãe. Este tempo que me viste chegar a ti, no último mês da década de 70, foi um período conturbado, complicado. A independência tinha 4 anos, a guerra entre os teus filhos não cessara, e as condições de vida eram difíceis. Mesmo assim, bochechudo e cabeludo, cá estava eu. Cresci, tive a oportunidade de alargar os meus horizontes. Vivi (e vivo) longe do teu seio muito tempo. Mais de metade dos meus poucos e crí(s)ticos 33 anos. Foi se calhar o que me permitiu ter consciência da importância  que tens para mim. Não há muitos sítios nesta vida que possamos chamar genuinamente de CASA. E por entre os diferentes poisos  que tive, alguns tornaram-se habitat, mas CASA não. Pelo menos não geograficamente.

Tenho por hábito dizer que, dada a vida que tenho, feita de viagens, de mudança como principal constante, o que constitui o meu porto, a minha referência desde sempre, é a minha família. Os meus amigos de infância são os meus irmãos, primos e primas. Estivesse eu em qualquer ponto do planeta, eles eram as pessoas que me conheciam, com quem brinquei, com quem me disputei de maneira seguida e constante... Não tenho aquele melhor amigo desde o tempo da escola primária, o mais "antigo" e com quem mantenho uma relação de amizade data de há pouco menos de 20 anos. 

Hoje, adulto, fora de CASA, descobri que apesar de tudo, há muitas pessoas com quem partilho experiências, que têm um percurso similar ao meu, e que com mais ou menos à vontade, consigo considerar como "casas secundárias". Estes amigos, raros e preciosos, com quem consigo identificar-me, e criar laços fortes. "Amigos, são uma família por nós escolhida", diz o ditado. Isso faz ainda mais sentido num contexto de "expatriação", em que estamos longe da Pátria Mãe; Cria-se um sentimento de pertença, a evocação de experiências vividas por todos, de lugares e pessoas que temos comum cria um sentimento de "como é que não nos conhecemos há mais tempo?"

Amigos temos ao longo de toda a vida, e tive muitos, de todas as origens e credos, mas não há como aquele amigo que compreende sem nunca terem falado da coisa, "como é que a coisa funciona". Aquele amigo que trata a nossa Mãe por Tia, aquele amigo que à evocação de uma rua, de uma escola, de um evento aparentemente banal mas que vos marcou aos dois da mesma maneira, aquele amigo que "apanha" as referências que tu fazes a músicas, filmes, livros, momentos... Em suma, aquele amigo que te dá a impressão de reviveres aqueles tempos da meninice em Luanda, da mesma maneira que um livro do Ondjaki consegue, e que nem ESTANDO em Luanda hoje em dia se consegue...




Várias maneiras uso para manter Angola viva dentro de mim. A minha família. A comida. A música. as expressões. Hoje em dia, está tudo "partilhado", via televisão, via internet, viaja tudo pra todo o lado à velocidade da Luz. Mas uma sentada entre kambas, fora de Angola, a evocar o passado, presente e futuro, imperceptivelmente reproduzindo o esquema que sempre vimos os nossos kotas fazer... Ajuda a aguentar as muitas frustrações de uma vida que nem sempre é aquela que sonhámos, as muitas saudades daquele lugar no tempo e no espaço em que éramos felizes e não sabíamos, aquela candura das amizades antigas e duradouras, sem interesse, em que os lanches eram comuns, não nos medíamos pelo valor do que temos, mas sim pelo que partilhávamos... Tudo isso ajuda a recriar uma Casa. Um lugar seguro.

Já não tenho idade para fazer novos amigos de infância (apesar de...), e mesmo Jesus, entre os 12 bradas que o seguiam dia e noite, foi traído por um. Mas deixem-me já, amigos meus, agradecer-vos pelas contínuas demonstrações de afecto. A vida encarregar-se-à de determinar quem fica e quem não, quem volta e quem não, mas saibam que a vossa presença na minha vida é uma força tremenda. Obrigado por serem "os da minha rua". Uma rua desmaterializada, mas onde cada encontro, cada brincadeira, cada confissão, cada choro e cada riso tem um valor impossível de calcular.